sexta-feira, 29 de março de 2013

No Dia do Teatro inspirações para o corpo em Arte para o corpo em VidaL!


No Dia do Teatro inspirações para o corpo em Arte para o corpo em VidaL!
Inspirado e dedicado para Fábio Vidal, Fabiana Araújo, Roberto de Abreu, Aroldo Fernandes, Jonhy Karlo, Adriana Galvão, Adriana Amorim, Jeane Mary, Gilsérgio Botelho, Kécia Prado, Osvaldice Conceição, Danielle Rosa, Victor Gally e Rita Batista.

Dessa vez, vou ser logo direto indo à pergunta inicial que estimula esta escrivinhação: O que te estimula como pessoa, cidadão e criador neste século frente a sua realidade de trabalho?!
Fiz recentemente esta pergunta num debate que ocorreu, após a apresentação do espetáculo O Circo de Soleinildo, da Cia Operakata, em Jequié, no interior da Bahia. O elenco e direção explanaram sobre o que achavam sobre esta questão enquanto eu tentava também, procurar uma resposta.
Semana passada tive a oportunidade de re-assistir (existe esta palavra?) o espetáculo Seu Bonfim, do ator baiano Fabio Vidal. Este trabalho estava em cartaz no teatro Arena em São Paulo, dentro do Projeto Melanina Acentuada contemplado pela Funarte para a ocupação do espaço cênico na capital paulista.
Logo na entrada encontrei a conhecida jornalista baiana Rita Batista que está morando em São Paulo, numa nova fase de trabalho. Juntos, falamos para sua amiga, sobre o espetáculo de Fábio e como ele nos marcou em diferentes épocas de nossas vidas.
Abrem as portas.
Começa o espetáculo.
O espaço do Arena é aconchegante e o silêncio paira no ar.
Entra o personagem e se instala no espaço.
Catarse, apoderamento, contemplação. 
Observo a reação da amiga de Rita e da platéia diante daquele acontecimento teatral.
O espetáculo e a presença de Fábio, completamente transfigurado na figura do velho contador de histórias, transforma aquele espaço num emaranhamento de afetamentos, desculpem a paranomásia, daquela platéia.
Eu particularmente, quando vi Seu Bonfim pela primeira vez, fiquei impressionado por vários motivos. Nesta época ia semanalmente para Salvador fazer Escola de Teatro e nesse tempo todo como licenciando da UFBA tendo um grupo de teatro no interior com uma demanda de trabalhos e produção eminentes, poucos professores e disciplinas conseguiram me inspirar e me afetar, como fez o espetáculo e a figura de Fábio, naquele momento. Quem era aquela figura por traz daquela persona? Esperei, nesse dia, até o final ansioso para ouvir a voz daquele ator que ali se apresentava.
Após este momento conheci Fábio, tecemos uma amizade e consegui levá-lo para Conquista onde ministrou curso no Caçuá e aos cênicos locais e depois para uma apresentação.
No início desse nesse mês, ele apresentou outro trabalho em Conquista, Sebastião, que merece outra escrita só para ele, e arrebatou a platéia e a admiração de artistas locais, como a eterna sonhadora Jeane Mary e os persistentes e incansáveis Gilsérgio e Kécia, da Operakata.
 
 
Fabio possui outra característica que admiro nos verdadeiros artistas: é um ser simples, sem  as frescuras e antipatia, típicas dos atores de Salvador que se consideram as Divas Baianas das Artes Cênicas, corrigindo as Divas SOTERAPOLITANAS das Artes Cênicas.
Não acredito numa arte dissociada da vida!
Ver Fabio em cena me traz uma série de questionamentos sobre o ator, o nosso oficio, o corpo em arte, a nossa contribuição diante de uma sociedade tão consumista e capitalista, diante de tantos questionamentos diários sobre a arte e sua real “utilidade” nesse século louco e corrido, que muitas vezes não nos proporciona a oportunidade de termos encontros e desencontros conosco, que nos coloquem em frente ao que ainda acreditamos, dos valores e coisas que realmente importam e ficam. E sobre isso o espetáculo dá muitas pistas, numa dramaturgia construída na simplicidade do essencial, salve, salve Denise Stoklos que viu em Fábio este potencial imenso transbordando!
Vidal nesse encontro feliz com Seu Bonfim nos coloca de bandeja, frente a questões profundas de caráter filosófico sobre a vida, a partir dessa memória criada em cena desse personagem multifacetado. A encenação coloca o expectador, com “x” mesmo, no centro, não na margem, nas outras margens, das atenções, preso na história daquele ser doce, amargo, sexual, contraditório, palhaço, mestre, solidário, egoísta: humano.
O espetáculo é cheio de imagens fortes e de uma fotografia linda!
Um círculo de farinha, o pó que sempre somos e voltaremos, se transmuta no responsório do relógio a marcar as nossas horas cotidianas.
O impressionante trabalho de corpo do ator enriquece a cena e visualizamos um Bonfim cotó e super ágil, nos forçando a lidar com as nossas perdas diárias e saber lidar com elas, sobretudo, com bom humor e fé, sempre!
Não vou aqui descrever o espetáculo, este é aquele tipo de trabalho que propõe uma vivência pessoal para quem assiste.
É impossível sair imune a Seu Bonfim!
Ora ficamos pensativos e reflexivos, ora rimos demais das engraçadices do véi popular, ou com a poesia e lirismo nordestinos que se revela, ora funciona como uma terapia e catarse.
Ao rever Seu Bonfim, assim como Rita, estando em São Paulo frente a uma qualificação e ampliação de horizontes fora da minha terra e das facilidades e dificuldades que ela impõe a um trabalhador das artes no interior baiano, pude, através do espelho de Oxum que Fabio e Seu Bonfim levantam, me ver como fruto do tempo, também.
Devemos estar sempre abertos, atentos e fortes aos novos caminhos que se abrem, sempre à frente, não no meio! Exercitar os desafios, o desapego, e as estradas, que a vida e o destino nos colocam, com alegria, entusiasmo, fé e tranquilidade.
 
Nessa linha de fuga que esta apreciação artística me proporcinou pude me ver, refletir e pensar em como é bom estar vivo e pulsante diante dos desafios que ela nos coloca.
Seria tão bom que assim como eu e a jornalista baiana, o homem da banca de jornal, a bilheteira do teatro, o cobrador de ônibus, o homem do sertão, do interior, da capital ou de São Paulo pudessem ter a oportunidade do teatro como contemplação e espelho para suas vidas, reflexões e mudanças.
Apesar de complexo, o espelho poder ampliar ou diminuir os reflexos do que se vê, como revelar que as oportunidades para os artistas do interior estão cada vez mais diminuídas; que o fluxo de artistas baianos para as capitais está cada vez mais constante; que estas desigualdades também podem revelar, influenciada por esta geração moderna e “google”, o surgimento de uma classe de “artistas” da cena que desconhece completamente seu oficio, sua profissão e prática, sobrando só uma vaidade glamurosa de estar em cena, ser diferente, oportunista, bobo da corte ou celebridade global!
Na apresentação de Fabio em Conquista, fiquei incomodado com um entra e sai da platéia, a insistência de um fotografo em cena, com a nova mentalidade dos novos “artista teatrais” da cidade. Conquista não é mais a mesma, né Caçuá 15 anos?!
No espelho de Fábio deveríamos todos no mirar e refletir as qualidades do artista baiano em nós: uma ética no fazer, uma dedicação intensa de trabalho e pesquisa, um carinho e humildade no lidar, e uma alegria renovadora sempre no fazer, isto me estimula e inspira como pessoa, cidadão, familia, profissional das artes cênicas, trabalhador do interior baiano, pesquisador...
 
Que no dia 31 de março, no Festival de Teatro em Curitiba, onde Seu Bonfim vai se apresentar, num coletivo de outros artistas de Salvador, o público possa se afetar com as histórias desse véi e se ver nos espelhos e relógios de farinha que o cavalo nos proporciona: um encontro feliz com nós mesmos, com as nossas verdades, com o que nos inspira, com o que nos faz vivos... com o nosso tempo!

Por um teatro de encontros reais e igualitário a todos!
 
Fábio, o meu carinho e admiração! Merda sempre!
Um Feliz Dia do Teatro a todos os artistas, principalmente, aos artistas e amigos trabalhadores cênicos do interior baiano.
MB
São Paulo, 28 de março de 2013, quinta-feira da paixão.
 
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