segunda-feira, 8 de abril de 2024

Quantos muros teremos que destruir para ainda sermos vistos??!

Foto´Amanada Barreto
Fui ver pela segunda vez o espetáculo: “A Fuzarca dos Descalços” do Coletivo dos Anjos, da cidade de Jandira-Sp. Fuzaca sem o "r" é um termo muito usado na cultura popular para se referir a festa, festejo, folia, alegria e celebração. Mas estar na folia descalço, com os pés no chão, principalmente se for na lama, grama, mato ou barro, deve se ter todo o cuidado para não levar uma “topada” e machucar o pé ou saber andar descalço e pisar ou sambar muito bem nesse chão de barro tendo muita experiência nessas bandas para usar um termo da moda agora. A peça conta com uma super trupe por trás desse trabalho, mas antes de falar desse grupo só queria perguntar uma coisa: Quantos muros ainda terremos que destruir para sermos vistos mesmos sendo lindos, potentes, negros e interioranos??! Fiquei abismado pelo espetáculo não ter sido indicado em nenhuma categoria para o Prêmio Shell de Teatro. Falo isso porque no ano de 1997 em São Paulo, o grupo que eu estava participando ganhou dois Prêmios Mambembes de Teatro: de Melhor Espetáculo e Melhor Direção numa peça com 40 atores e atrizes no elenco e que com esse prêmio possibilitou muitas coisas, como por exemplo, que viajássemos pelo interior paulista, inclusive, indo apresentar na terra do dramaturgo do texto, Plinio Marcos, em Santos e sendo censurados. Um prêmio ou uma indicação implementa muitas coisas! Meu grupo de Teatro do interior da Bahia fez 25 anos o ano passado e já conquistou alguns prêmios e editais numa briga eterna briga entre o artista da capital e do interior e parece que isso acontece aqui na grande metrópole paulista também. Criamos até o MOVAI! https://movimentomovai.blogspot.com/2011/03/o-que-e-o-movai.html Acho que essas questões devem ser pautadas, além da inegável qualidade desse trabalho emocionante. Um “Esperando Godot” discutindo questões pretas com tanta poesia e lâmina é inacreditável! Sou e gosto de um teatro das antigas, daqueles com uma boa mensagem, além dos virtuosismos e efeitos especiais. São Paulo está cheio de espetáculos com seus respectivos públicos cada vez mais chatos e exigentes. Tem até gente que diz que não existe “teatro popular” aquele o qual acredito e faço. O Sudeste acha que só ele que faz teatro e arte no Brasil! Em Fuzarca dos Descalços o texto afiado do premiado dramaturgo Victor Nóvoa nos chacoalha com uma inteligência quase clownesca estampada na mensagem, na cara e o riso angustiado de não querer entender tantas verdades ditas na nossa cara como um clown. Isso é uma maestria do trabalho! Salloma e Éder são dois Augustos e Brancos e o erê de Éder pula várias vezes em cena! Salloma tem beleza, medo e mistério de um Caboclo de lança do Maracatu Rural. A cenografia funcional e a sonoplastia como outro personagem completa a obra. Queria não ter entendido o choro daquela cuica tocada por Ito (eu acho). Sou de terreiro e de escola de samba,não tem para onde fugir! E a mão de Aysha Nascimento na direção artística como uma Iansâ Onira se vê em vários momentos. É um trabalho para uma mulher dirigir, uma mulher preta. Esse elenco quase todo preto ou todo preto não fez diferença ao Prêmio Shell num dos melhores espetáculos do ano, ganhador de vários editais de circulação e não cobrando nada para se assistir o espetáculo, é bom que se diga, mas que mesmo assim precisa quebrar muitos muros para ser visto ou criar seu próprio prêmio como algumas instituições fazem para premiar os seus coligados. Que Exu traga a estrada para esse trabalho tão necessário e que precisa ser visto por muita gente ainda e Xangô, justiça! Serviço O Espetáculo terminou uma temporada no CCSP e na Oficina Cultura Oswald de Andrade Em maio terá uma circulação e pelo Proac Com 6 apresentações 2 na periferia da capital e 4 nas cidades do entorno Osasco Francisco Morato Barueri Imperdível! Fiquem ligados!

domingo, 13 de agosto de 2023

Havia uma pedra no meio do casulo- Mãos Trêmulas eclode em poesia num espetáculo sobre pessoas comuns como eu e você.

 

Havia uma pedra no meio do casulo- Mãos Trêmulas eclode em poesia num espetáculo sobre pessoas comuns como eu e você.


No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

O conhecido poema de Drummond sintetiza o espetáculo Mãos Trêmulas com dramaturgia de Victor Nóvoa e direção de Yara de Novaes que encerrou sua temporada no Teatro Sérgio Cardoso em São Paulo, no dia 10 de agosto desse ano.

A primeira interpretação do poema, a ”pedra” pode significar obstáculos, dificuldades, os problemas que podem impedir das pessoas avançar na vida, ou que transmitem uma sensação de cansaço por parte do poeta,  ficando sempre na memória de retinas fatigadas e vividas tal impressão.

Na nossa memória diante da fruição de Mãos Tremulas fica o registro de um acontecimento teatral de uma poesia e lirismos tocantes por motivos que não são óbvios.

A dramaturgia premiada de Victor Nóvoa já vem pronta. Mãos Trêmulas foi premiada pela II edição do Prêmio Dramaturgias Em Processo do TUSP, e também foi contemplado na 15ª Edição do Prêmio Zé Renato da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo que possibilita a produção e circulação de espetáculos teatrais desenvolvidos por núcleos artísticos de grupos de teatro e pequenos e médios produtores.

Voltando a dramaturgia, nela, estão as indicações de quase tudo para uma excelente encenação.  Nóvoa brinca com suas memórias com as palavras ditas pelas bocas das personagens e lampejos do imaginário popular seu e de tantos outros, pois respinga no público como em mim e no meu Entre a Cruz, a Espada e a Estrada, que vi também possível para acontecer nessa capital paulistana que tanto segrega. No texto, ainda há indicações para o figurino, objetos de cena, músicas que permitem que a peça teatral passeie pelos elementos do teatro de forma natural, sem firulas ou efeitos pirotécnicos para chamar a atenção e isso a encenadora Yara de Novaes foi sábia ao perceber e explorar na encenação. Um texto teatral quando é completo apresenta as nuances prontas facilitando a vida da direção.

Nessa encenação, Yara optou pela singeleza! O lindo figurino de Fabio Namatame junto ao cenário de André Cortez compõe esse casulo borboletador em tons de ocre que é super bem utilizado durante a encenação. Parecia A mais forte de Strindberg onde em Festivais de Teatro das antigas víamos frequentemente por ser um trabalho “enxuto” e de boa produção para viajar.   Aliás, Mãos Tremulas é um teatro das antigas, pois conserva uma simplicidade técnica de falar óbvio da trindade:  texto, atuação e direção, o que tem se perdido na contemporaneidade, sobretudo, em São Paulo com tantas produções em cartaz com intuito mais comerciais que artísticos ou o de comunicar uma mensagem transformadora ao expectador.

Mãos Trêmulas avança ao expor em cena a relação de dois personagens idosos. Idosos, velhos, borocoxôs, maduros, longevos, ancestrais, da terceira idade? Embora a sinopse explorada noutras temporadas aponta que a peça reflete sobre pessoas descartadas pelo mercado de trabalho, e que seguem com perspectivas financeiras e desejos e, juntos, criam estratégias para não serem despejados ou ainda, sobre o etarismo de pessoas periféricas frente ao capitalismo, etc,  a  encenação toca num ponto primordial que a primeira cena deixa evidente: NOS OLHEM!!

Há pouco tempo na Bahia, junto ao Caçuá de Teatro, estivemos numa visita a uma casa de acolhimento para idosos. A primeira ideia que se pensa é de tristeza, morte, definhação, mas é o contrário, eles estão lá, vivos, alegres, tornando seu corpo memoria vivo! Temos uma visão tão equivocada da velhice! Na cultura popular a sabedoria dos mais velhos é referência, e esses corpos estão vivos, potentes, se divertem, até cozinham, ré-fazem e cozinham memórias num ato ação de suas trajetórias, cantam, bebem, dançam e transam. Nossa, ainda é tabu falar de sexo na terceira idade em pleno século XXI? Como se diz na Bahia: me deixe, vu, e me bata uma garapa! A cena é tão poética que parece um jogo de clowns, talvez vindo das vivencias do dramaturgo palhaço, que me lembra outro saudoso palhaço no seu linguajar, com quem tive o prazer de trabalhar na encenação do “Assassinato do Anão...", 1997-98, que também passou pelos palcos do Sérgio Cardoso, a sua benção, Plinio Marcos.

Ficaria horas falando dessa encenação e dos protagonistas divos, Cleide Queiroz e Plinio Soares. Essa encenação só é o que é, em grande parte, por causa desses dois artistas!

Pense nesse texto feito por atores jovens, não rola! Ou por atores mal resolvidos com seu corpo e idade? Ou por atores sem vivência que o texto aponta, também não! Aquele “tu” proferido no texto revela muito. A diva Cleide dá um banho de entrega junto com Plinio que carinhosamente a abraça de corpo e alma. Plinio é carinhoso por demais e muitas vezes abre os caminhos para sua parceira. Tu já viu numa relação entre homem e mulher quem é que manda? As cenas dos abraços, do soltar dos cabelos e a Dança das mãos trêmulas que ainda dançam é espetáculo a parte dentro da obra.

Hoje, 13/08/2023, às 19 horas,  a peça estará em cartaz na Mostra de Teatro Heliópolis e ainda dá tempo para correr e ver esse acontecimento teatral que espero ganhar mais prêmios e temporadas nesse ano, assim como o filme:   Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo que foi o grande destaque do Oscar 2023 e levou sete dos 11 prêmios em que concorria — incluindo o de Melhor Filme. A história se baseia na premissa do multiverso e da possibilidade de saltar entre uma realidade paralela e outra.  Os atores veteranos e por que não dizer velhos, idosos, borocoxôs, da terceira idade:  Ke Huy Quan, Jamie Lee Curtis, Michelle Yeoh levaram as estatuetas por suas atuações.

Assim como o filme superpremiado no Oscar e a peça Mãos Trêmulas no nosso Brasil Tupiniquim, onde suas cenas finais se correlacionam, que possamos extrapolar o multiverso criando outras realidades para pessoas que já viveram um pouco mais que nós e que ainda estão potentes, vivas, inteiras e felizes nessa encenação da realidade que podemos chamar de vida! A pedra do meio no caminho não é o que parece! O envelhecimento é um processo natural, que merece respeito, dignidade e condições para eclodir, renascendo, sobrevivendo! Sons do mar! Odoyá, A ancestral não sai de cena um só momento! Saluba Nanã!


As fotos usadas nessa postagem são de Noelia Nájera.

quinta-feira, 1 de junho de 2023

MUTAÇÃO DE APOTEOSE DO OFICINA ESTREIA NA VIRADA CULTURAL EM SÃO PAULO. MAS CADÊ O SERTÃO?!

 

MUTAÇÃO DE APOTEOSE DO OFICINA ESTREIA NA VIRADA CULTURAL EM SÃO PAULO. MAS CADÊ O SERTÃO?!

 

O que se segue são vagas conjeturas. Atravessamo-lo no prelúdio de um estio ardente e, vendo-o apenas nessas quadra, vimo-lo sob o pior aspecto. O que escrevemos tem o traço defeituoso dessa impressão isolada, desfavorecida, ademais, por um meio contraposto à serenidade do pensamento, tolhido pelas emoções da guerra. (CUNHA, 1985, p. 110)

 

Estreou na Virada Cultural de São Paulo, dia 27 de maio de 2023, o novo trabalho do Teatro Oficina, intitulado: Mutação de Apoteose.  O Mutação ou A Mutação se auto define como um “acontecimento cênico-musical”, “é um carnaval multiespécie, é uma filosofia vegetal, é uma ficção especulativa contra a monocultura do pensamento, é um ato cosmopolítico de teatro, é um espetáculo de transmutação para a companhia, é a invenção de um mundo”, mas acaba se atropelando justamente pelo excesso de elucubrações e de elenco.  

O espetáculo “Mutação de Apoteose”, é inspirado em trecho de “A terra”, primeira parte de Os Sertões, de Euclides da Cunha. Estreou na Sessão de Abertura da 17ª Festa Literária Internacional de Paraty – Flip em 2019, realizada pela Universidade Antropófaga com direção artística da atriz Camila Mota.

Pelas redes sociais e pelo Instagram da companhia viam-se as chamadas entusiasmadas e inflamadas com frases de efeito do elenco sobre esse trabalho/experimentação. Umas das inspirações é a obra literária: “Os Sertões” de Euclides da Cunha.

Lá vem mais cariocas ou paulistas falando do Nordeste ou da Bahia! Em tempos de decolonialidade ou do termo decolonial em alta, esse não é o único equívoco cometido pelo grupo. O próprio Euclides da Cunha era carioca e foi enviado como correspondente ao Sertão da Bahia, pelo jornal O Estado de São Paulo, para cobrir a guerra no município de Canudos. “Do seu lugar de fala de homem branco, republicano, urbano, habitante do litoral, ex-militar e fruto de uma educação europeizada, Euclides enxergava o mundo por meio de instrumentos ideológicos que eram incapazes de darem conta do que havia visto no sertão de Canudos.” como diz o jornalista Fausto Salvatori no seu excelente artigo: “Os Sertões”, de Euclides da Cunha: o racista que denunciou um genocídio. Mas voltemos a fruição da experiência onde um elenco numeroso e polifônico  e a encenação  e dramaturgia não dão conta do emaranhado de referências dessa geração desconstruide e intensa.

Nessa confusão Babilônica de vozes e discursos, a encenadora Camila Mota deve ter tido muito trabalho para tentar dar uma cara a essa ficção especulativa contra a monocultura do pensamento. Conhecemos a força e trajetória dessa artista! É evidente que Camila quebra um patriarcado dentro do Oficina encabeçando essa direção, (queria ver mais Cacilda, Camila, mais Cacilda com mais exclamações!!!!!) porém, nessa encenação em alguns pontos ela consegue êxito, noutros não.

O Oficina é um território conhecido do teatro paulistano e nacional e Camila sabe disso e usa tudo o que consagrou aquele teatro, como o melhor teatro do mundo, segundo o The Observer, do jornal  inglês dominical do The Guardian, a seu favor.

E que saudade do Oficina! Nesse ínterim, a encenadora explora todo o espaço cênico, fosso, céu aberto, área externa, vídeos com imagens, outra marca registrada do daquele Te-Ato.

Há uma previsibilidade para um público amante daquele teatro, e não sei se isso é bom ou ruim, mas a encenação não empolga como outros trabalhos anteriores da Universidade Antropófaga como: “Rito da Primeira Estação Pau Brasil” (2015) que revelou a maravilhosa atriz trans Wallie Ruy. Em Mutação o elenco poderia ser menor, pois um elenco numeroso atrapalha mais que ajuda, sem falar que a atuação de coro proposta pelo Oficina muitas vezes é desconhecida pelos novos atores e atrizes que ali pisam. Atuar, ou simplesmente existir naquele espaço não é fácil e as receitas stanislavskianas ou performáticas dos atores poucos valerão. Nessa tentativa de atuar e ser presença ou se fazer presente em cena vale tudo, até mesmo muitas caras e bocas e “carão”! É notório ver em cena, de cima da plateia, onde nada nos escapa, o desconforto de alguns, ou o corpo de cavalo morto para usar uma expressão do próprio Euclides da Cunha nos Sertões, de outros.

Quem salva o elenco, sem dúvidas, são os atuadores nordestinos e negres ali presentes.

Percebe-se nessa montagem uma profusão de atuadores nordestinos, (graça a Deus,)  que salvam o trabalho, assim como um país como nessa última eleição! Destaque total para atriz de Feira de Santana, Pitty Ferreira, que como candeeiro alumia o olhar do expectador. Ela aproveita seu estado de cena para encantar a plateia como iara catingueira, e quando aparece com uma sanfona tocando, mostra definitivamente para que veio. Fiquem de olho nessa moça!  Dan Salas e  Joel Carlos também não passam despercebidos em suas aparições. Loci, Loci!

O nosso olhar vageia e acaba pairando nas bacantes e sátiros cobras criadas do Oficina que agregam um valor altíssimo a encenação. Sem eles a fruição de acontecimento cênico musical poderia ser bem pior. Letícia, Nash, Dani, Ma Dalourzi, Cyro, Tulio, Kelly, Sylvia, Marcio Telles e uma Jennifer Glass plena na pista são um deleite daquele teatro, sem falar na luxuosa banda com o muso multiartista Gui Calzavara que fariam qualquer atuador se esmerar mais um pouco ao pisar e andar naquele terreiro eletrônico sagrado.  Não sabe brincar não desce pra pista! Andar, simplesmente andar pode parecer algo bobo para um atuadore, mas não é!

O elenco é afinado ao cantar, mas ainda está atrapalhado nas marcações de cena. Há momentos e imagens bonitas, como as entradas de Iemanjá e Oxum, que na rua já experimentadas anteriormente pelo Oficina soam infinitamente mais potentes, (para usar uma palavra da moda, dos que mal sabem o que é um rizoma), e a “passeata vermelha,” (de arrepiar!) que remete a tantas lutas que passamos nesse pais tropical.

O número cantado da atriz May Tuti dá seu nome, incorporado no seu corpo discurso todas as vozes das mulheres pretas que já passaram por aquele espaço, batendo a cabeça para Cellia Nascimento, Denise Assunção e muitas outras! Já falei delas noutro trabalho do Oficina. (http://marcelobenigno.blogspot.com/2015/11/felicidade-clandestina-misterios.html).

O segundo ato do trabalho é desnecessário, pelo menos como espetáculo. Como pesquisa do coletivo, talvez funcione. O elenco entra cansado em cena lembrando do nosso cansaço também. Até a música colorida perde samba e ritmo. Poderia ser mais enxuto, mais seco, mais caatinga. Falta caatinga na Apoteose de Camila! Numa hora que se diz na encenação claramente de sertão, entra uma atriz sarará desfilando um vestido de calda, esburacado preto,  quase  uma alta costura da  coleção outono-inverno 2022 de Jean-Paul Gaultier ou um modelo do desfile do SPFW desse mês, numa tentativa de representação  contemporânea da seca?! (...) Falta vivencia da seca e sertão ali, falta apoteose sertaneja, falta ali “caititus esquivos”, os “queixadas de canela ruiva” as “emas velocíssimas”, as “seriemas de vozes lamentosas”, as “sericóias vibrantes”, as “suçuaranas”, os “mocós espertos” e ainda os “veados ariscos” e os “novilhos desgarrados”. (CUNHA, 1985, p. 127).

Ai que saudade eu tenho da Bahia! Ai Euclides da Cunha, digo a cidade não o escritor!

“Galga-se uma ondulação qualquer - e ele se desvenda ou se deixa adivinhar, ao longe, no quadro tristonho de um horizonte monótono em que se esbate, uniforme, sem um traço diversamente colorido, o pardo requeimado das caatingas” (CUNHA, 1985, p. 99)

Ao final da estreia a atriz Sylvia Prado fala da difícil missão de Camila sobre a encenação, sem recursos, como elenco numeroso nos oito meses de trabalho etc, etc, etc.

O que não fica claro se o resultado ali é fruto da Escola da Universidade Antropófaga num resultado de vivências ou estudos, ou do Oficina. Esse novo grupo de jovens Cecillers é o novo Oficina agora? Não entendi!

Há além da Universidade Antropófaga outros grupos de estudos e formação de atores espalhados pelo Brasil com intuitos parecidos, como o Galpão Cine Horto do Grupo Galpão em Belo Horizonte, a Terreira da Tribo do Ói Nóis aqui Traveiz,  no Rio Grande do Sul, a Universidade Livre do Teatro Vila Velha em Salvador, as Oficinas do Caçuá de Teatro em Conquista...

Definir os formatos e discursos talvez seria mais proveitoso! Quem é o ator/ atriz ou atuadore que não gostaria de atuar no Teatro Oficina com toda sua estética e recursos? Como o Teatro Oficina pode ser mais acessível como centro de estudos de forma mais organizada e acessível para pessoas, estudantes ou pesquisadores? Como compartilhar mais tanta história e memorias daquele espaço?

Falando em memorias é impossível desassociá-las do Oficina completando seus 65 anos de vida e trajetória. Pisar no solo sagrado do Oficina requer muita responsabilidade, trabalhos intensos, estudos, vivências que talvez só serão percebidos por alguns com muitos calos nas mãos, chão e janelas de estrada, estudos, experiências no corpoartediscurso ou de muita farinha e pirão de mocotó. ( Ops, os paulistanes  e Cecilliers não comem nem farinha nem mocotó, desculpem esse bode véio catingueiro, caipira simplório como descreve o autor carioca inspirador para esta encenação.)

Vale a pena assistir para matar a saudade do Oficina e de Zé Celso, nosso eterno Exu das Artes.

Em Mutação de Apoteose o grande destaque protagonista pulsante é o Teatro Oficina, sem dúvidas!


SERVIÇO:

Mutação de Apoteose

TEMPORADA: 27/05 a 23/07, sexta a domingo.

Na estreia: 27/05 às 21h 28/05 às 19h

Depois, sempre sexta e sábado às 20h; domingo às 19h

Local: Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona

Endereço: R. Jaceguai, 520 - Bixiga, São Paulo - SP


PS: As fotos aqui postadas são do ensaio aberto publicadas no facebook de Jennifer Glass. Créditos das fotos: Gal Oppido