sábado, 10 de maio de 2008
GUIGÓ
A benção em José Gonçalves
Devo confessar que nunca em minha curta carreira levantei pouso tantas vezes em um mesmo fim de semana. Depois de passar por Itambé e Vitória da Conquista, agora era a vez de desbravar José Gonçalves, distrito desta mesma cidade. Esse lugarejo, berço de toda minha árvore genealógica, é muito especial para mim em particular.
Saímos de Vitória da Conquista entre sete e oito horas da manhã do domingo. Não é grande a distância entre o distrito e a sede. Desde o início da viagem comecei a perceber que ali aconteceria um grande laboratório de vivência popular. Pegamos um transporte alternativo na Ceasa de Conquista, que por sinal, estava muito lotado. Alguns alunos da oficina nos acompanharam, pois fazia parte da oficina a vivência em campo.
Quando chegamos ao distrito carinhosamente apelidado de “Guigó” a missa já havia começado. Aliás, estava quase no seu final. Colocamos-nos a postos esperando que a mesma se encerrasse. De longe já comecei admirar as figuras populares compenetradas rezando e acompanhando a missa. Olhares fortes, marcas do sol e do trabalho. Mesmo de longe dava pra distinguir daquela multidão de fiéis alguns tipos: as senhoras carolas, as mocinhas casadoiras, os homens do campo, etc.
Fomos muito bem recebidos pela comunidade. Confessei a alguns colegas o receio de ao término da missa ninguém querer assistir o espetáculo. Mas para minha grande surpresa, quando o padre anunciou o fim da missa ninguém fez menção que iria se levantar. Ao contrário, esperavam ansiosos pelo início do espetáculo.
Tudo pronto. Começa o espetáculo. De longe surge o contador com o seu Caçuá no ombro acompanhado dos músicos. Daí em diante, uma energia jamais sentida começou a me contagiar. Era notável a intensa sintonia entre ator e platéia. Todos os códigos do espetáculo eram interpretados com fidedignidade pela mesma. Naquele efêmero momento, rompiam-se os limites entre ator e platéia, fantasia e realidade, arte e vida real, autor e obra, Marcelo Benigno e sua história.
Em qual lugar se não ali, personagens como Durvalina e seu Belo poderiam ser tão compreendidos? Muitos ali presentes conviveram com esses personagens durante toda a sua vida. Realmente, era um momento que se tornaria fértil material de estudo para ares como a etnocenologia, defendida e sistematizada por pesquisadores como Armindo Bião.
Muitas sensações se misturavam ao meu imaginário. Sentia-me num cenário medieval onde o sagrado e o profano se misturavam. Aprazia-me também a idéia de fazer teatro popular para o povo, o que poucas vezes temos a oportunidade de proporcionar. Era contagiante também a empolgação de Marcelo Benigno quando falava do lugar, daquela igreja onde ele deu os primeiros passos com o teatro.
Terminada a apresentação, muitas pessoas do público choraram, principalmente os mais idosos e amigos que acompanharam a infância de Benigno. Ficamos visivelmente emocionados. Todos da equipe choraram, bombardeados com um arsenal de emoções e memórias. Senti-me revigorado e energizado. Aquela manhã de domingo, pra mim, valeu por todo o projeto.
Encerrando com chave de ouro aquela manhã, ao regressarmos a conquista fomos para a “Feira do Bairro Brasil” comer um delicioso almoço de feira para dar sustança para a última apresentação da noite no Centro de Cultura.
O sucesso do primeiro dia e a apresentação da manhã energizou a última apresentação do dia. A platéia estava bem mais cheia que no sábado e o público mais ainda participativo. Destaque para a presença de Esechias Araújo Lima, grande fomentador da cultura na região, e co-autor do texto “Auto da Gamela” recém montado pelo Grupo Finos Trapos, também de Vitória da Conquista, o qual também sou membro.
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