CERCADINHO DE AFETOS
No jogo do teatro popular empoderado nos
encontros do Proler 2018
Minha história com o Proler não é de hoje! Em 1996, como aluno
do curso de Letras da UESB, participei do meu primeiro encontro. Dois anos depois,
agora como Professor de Teatro na mesma universidade, ministrei a oficina “Leitura e Teatro”
para professores e pedagogas de Conquista. No final, como resultado, montamos o
que seria uma Escola Escolástica de
Leitura de freiras inspirados no filme “Mudança de Hábito”, falamos do
poder da leitura e suas inflexões. Consegui túnicas para todas, fiz uma paródia
com a música do filme, no ônibus da Salutaris, vindo numa dessas apresentações do
“Assassinato do Anão...”, que estava viajando em festivais e cidades do interior
paulista, do qual fazia parte. Tenho fotos dessa oficina, vou achar e repostar
aqui.
Em 2015, voltei a Vdc Lost e fui convidado a participar do
XXIV Encontro de Leitura do Proler, que aconteceu no povoado de Inhobim, onde fiz a oficina: “Jogos
Teatrais e Teatro Popular”. Era uma turma de adolescentes que, apesar da apatia
típica, gostaram da proposta.
Proler em Inhobim |
Cercadinho- Bahia- Visão da nossa sala |
Agora em 2018 volto ao XVII Encontro do Proler no povoado de
Cercadinho. Como a resposta da oficina anterior fora positiva, eu planejava refaze-la e encerrar com um cordel, mas ao chegar em Cercadinho, vi que
era uma turma de crianças e não de adolescentes. No jogo de
cintura, literalmente, e no jogo do caatingueiro brincante, adequei e transformei
a proposta inicial. Falo isso porque todas as idades podem - e devem - fazer teatro, mas para cada uma, metodologias e atividades específicas.
Foram três dias de corre corre, energia, energia, energia dos erês, que não acabava mais! A pessoa quer dar oficina para crianças e acha
que eles vão ficar quietos o tempo todo?! Fica a dica para os meus ex alunos do
curso de Licenciatura em Teatro da Ufba.
Primeiro dia de Oficina |
A turma era bastante enérgica, mas
super respeitosa. Contei também com o super apoio da professora Shirley
Nascimento, que me auxiliou. Os erês, às vezes, querem nos fazer de besta, querem brincar, correr, pular, ser feliz... e eu deixo! Entro
no jogo, afinal, eram só três dias - o lado benigno tem que aflorar primeiro, e a
doçura não significa falta de rigor, ainda mais no teatro - . Fiz até umas posições de ioga com eles e expliquei que na vida, assim como no teatro ou na escola, tem hora pra tudo. Sou calmo, de boa, mas sempre que precisa, fico arretado... Desculpem o linguajar popular, mas quem fala aqui é
mais o caatingueiro brincante que o acadêmico chato, e a poesia e cultura do
sertão me serão de mais valia que qualquer outra coisa.
Segundo dia da Oficina |
Antes do teatro |
Depois do teatro |
Foi linda a entrega deles! Trabalhei com Jogos Teatrais,
leitura e inflexão, o jogo das caixinhas (assim que eu chamo) de improvisação,
a máscara neutra para chegar na máscara dell’arte, para chegar no cordel. Ufa!
Ceis pensa que “ensinar” ou experienciar arte é fácil?!
Exercício com as máscaras neutras |
Foto séria que vai pro relatório, rs. |
Ações cotidianas com as máscaras |
Relatório dos participantes. Um desenho sobre o que mais gostou ou lembra a oficina de teatro |
Então chega o dia de mostrarmos o resultado da Oficina para as
pessoas e público no dia de encerramento. Éramos o quinto grupo a se apresentar.
Reunimos a turma numa sala e fizemos uma roda de
concentração. Expliquei a eles que este momento de roda e concentração é
importante quando se vai fazer uma apresentação, e conclui explicando o significado
da expressão Merda em Teatro, e desejamos Merda a todos!
Heitor e seu desenho. Uau ficou lindo! |
A apresentação foi quase uma aula pública, pois escolhemos exercícios que tínhamos feitos no decorrer da Oficina. Acredito que todo resultado artístico deve fazer parte do processo de trabalho, não meramente focado num produto ou resultado. Há uma febre das escolas em Conquista, e em geral, de fazer aquela apresentação de final de ano para os pais verem, com objetivos desconectados da prática e vivência dos participantes. Tem cada coisa que eu vejo...
Máscara, caixinha, Shirley e eu! |
Ganhar um "eu te amo" não tem preço! |
Fazer teatro é algo muito sério, expor uma criança, um adolescente
ou até um adulto em cena exige muita responsabilidade e cuidado.
Decidimos juntos
o que iríamos apresentar e quem o faria, já que na oficina todos puderam experienciar
tudo o que fizemos, individualmente, em dupla, em trio, ou em grupo, e tínhamos
pouco tempo diante de toda a programação do encerramento. Teve tudo e até apareceu
um velho por lá! Cantamos as cantigas populares
do repertório do caatingueiro (Caçuá de Teatro 20 anos) e enceramos com o Cordel
do Pavão Misterioso.
Segundo Pietra eu e Shirley em cena! |
Foi lindo, calmo, tranquilo, sem cobranças, no jogo infantil da
alegria e da troca. Viva os erês!
Paisagem Típica da Suíça Bahiana |
Esses dias em Cercadinho, a viagem saindo de Vdc Lost para a comunidade,
a paisagem tipicamente seca de caatinga, as conversas com a equipe e todxs xs
oficineirxs, as cantigas, a visita ao flamboyant mostram que devemos sair das
nossas bolhas e estar com as pessoas. A arte, a leitura, o teatro devem ir ao encontro do povo. Por isso que faço Teatro Popular!
O Flamboyant e a nossa cantoria |
O Proler tem uma missão incrível e muitos saíram afetados positivamente
com os encontros dessa edição que reverberarão em nosso corpo - memória - discurso
por muito tempo.
Em casa, encontrei o bilhete de uma mãe que agradecia pela
alegria do filho ao chegar em casa após a oficina, só que ele não poderia ir no
último dia, pois tinha compromisso marcado na cidade.
Pé de tamarino em Cercadinho. Quem gosta?! |
Que possamos pensar cada vez mais numa arte destinada a todos! Uma arte acessível e transformadora para mudar essa comunidade, cidade, estado, país.
Só a arte e a educação conseguem nos libertar desse sistema
aprisionador e dar fissuras de respiração e transformação nessa nossa Matrix louca
e luta cotidiana pela sobrevivência.
Que reconheçamos a nossa identidade e força, e assumamos a
nossa caatinga e valores. Pois de Suíça Bahiana estamos cansados!
"Vamos deixar de lado a Revolução Francesa e a
Soviética, para descobrir a feijoada, o carnaval, o frevo. Nossa cultura é a
macumba, não a ópera." Glauber Rocha
Saíam das suas bolhas, conquistenses, conheçam sua cidade, a
zona rural, as periferias, os artistas locais.
Viver nessa cidade tão antagônica e diversa se achando “a última bolacha (importada) do pacote”, além
de ser cafona, está fora de moda!
Obrigado, Professora Heleusa Câmara, pelo carinho e energia!
Tem pessoas que são entidades e estão em outro plano de energia! Uau!
Gal Novato Dona Heleusa Câmara e eu! |
A equipe da Escola Rui Barbosa, a amiga Nailde, Fernando,
Iracema, as meninas da cozinha: Leninha, Luzia e Cristina (que comida foi aquela,
que tempero!!) A pessoa é da cultura popular e cultura popular sem comida não existe!
Agradeci pessoalmente, pois temos o hábito de quando um serviço é ruim criticar,
mas quando é em excelência, não elogiamos! Meninas, vocês arrasaram!
Equipe da Escola Rui Barbos a e equipe do Proler |
Momento lindo homenagem as pessoas que contribuíram com a história da comunidade. Nessa escola eu acredito! |
Aos encontros com tanta gente linda e porreta, Paula
Ferreira, Claudia Ferraz, Gal Novato, Keu Souza, Ebenilde Araujo, Jeane Marie, e todxs que
religaram conosco. Gal Novato, quando eu crescer, quero ser igual a você! Só o
poder da ancestralidade! Axé!
A Cris Leilane e Alexsandra Santos, companheiras do Núcleo Pedagógico
da Smed. A jornalista gata garota Joana Rocha.
Kêu Souza na Abertura do Desfile de Gal- Poder feminino e ancestral. Axé! |
Gal Novato e o Muso do Proler 2018 Jefferson! |
Os erês, eu e Shirley. Foto certinha com nós não cola , rs. |
E a minha turminha linda de erês que tornou esses dias
mais bonitos e alegres.
E para finalizar essa escrita, a imagem que vem é a da apresentação
que encerrou o encontro da “Dança da Saia”, com a professora Marli Campos e
alunos. Energia pura, presença, entrega, quando uma professora sai do seu papel
“tradicional” e assume outros papéis para estimular e celebrar com seus alunos
e educandos. Lindo de ver! Muito forte e potente! Nisso em que eu acredito! Me representa!
Arrepiou! Para esses professores e pedagogos aprenderem a se jogar! Saiam das
salas de aula, dos escritórios e gabinetes fechados, queridxs, venham pra roda sambar com
nós!
A Dança da Saia com a professora Marli Campos e a meninada. Energia pura! Irradiados! |
Toc, toc! |
Axé, evoé e merda! Só a arte salva!
Viva a leitura e o teatro empoderadores!
PS: Estarei em cartaz com o espetáculo “Entre a Cruz, a
Espada e a Estrada- Como nasce um Artista Sertanejo” nos dias 05 e 06 de
outubro, às 20 horas, no Camillo de Jesus Lima! Só serão duas apresentações. Se quiserem
conhecer mais um tiquim desse caatingueiro sonhador, vão lá religar conosco! Precisamos
nos unir e transformar essa cidade com cultura e arte!
Foto- Luiz Eduardo Fiuza |
Nenhum comentário:
Postar um comentário