POVO MEU,
Freud, vugo Ayrson Heraclito, amigo e artista conquistense, está bonbando por ai!!
Recentemente esteve em cartaz com mais uma performance provocante em Salvador, no Mercado Cultural. Desta vez foi na parte de cima do TCA onde cabeças são evocadas e oferecidas africanamente.
Bori-Performance Art
AYRSON HERÁCLITO
Oferendas à cabeça, visto que o destino das pessoas reside, em princípio na cabeça ( Ori).
Alimentar a cabeça com comidas para os deuses é evocar proteção.
Dar comida para a cabeça é alimentar a nossa alma.
03.12 / 18 às 20h – Jardim Suspenso do Teatro Castro Alves
Recebi uma crítica bastante contudente de um dos seus trabalhos, Divisor 2, o que está na fotos acima, depois das cabeças, e compartilho com vcs.
Conquista fervilha de artistas que ganham espaço fora da cidade, pois nela todos morrem sem reconhecimento para expandir sua arte.
Parabéns nego!
Evoéh!
Vejam o blog do artista:
Vidro + água + óleo + sal = arte
Roberto Conduru
O que pensar diante de três grandes caixas de vidro, cada qual com 100 x 200 x 25 cm, contendo água, óleo e sal? É um experimento a investigar densidades, pesos e relações físico-químicas dessas substâncias? É uma peça de demonstração dessas propriedades?
A princípio, não. Foi idealizada por Ayrson Heráclito e tem como título Divisor 2. Como ele atua como artista a partir de Salvador e a obra foi apresentada na III Bienal de Artes Visuais do Mercosul, realizada em Porto Alegre, em 2001, conclui-se que não é uma experiência científica ou um dispositivo didático, mas uma proposição artística baseada na ampliação atual dos limites e meios da arte.
Como obra de arte, pretende ir além da literalidade daqueles compostos e de suas relações, explorando dimensões metafóricas. Entretanto, para pensar a o quê se refere essa obra, é necessário justo partir dos elementos que a compõem, observando como os mesmos nela interagem. Primeiro, é preciso lembrar que água e sal estão indissociáveis no mar.
Depois, deve-se notar que a substância oleaginosa empregada é o óleo de palma, que é fabricado a partir dos cocos do dendezeiro (Elaeis guineensis), uma árvore que tem múltiplos sentidos e usos nas práticas das religiões afro-descendentes no Brasil. Conhecido como azeite de dendê, ou azeite-de-cheiro e epô, esse óleo ganhou a gastronomia no Brasil, sendo usado na feitura da moqueca, do vatapá e de outros pratos da culinária largamente conhecida como baiana, apesar de também ser feita e comida em outras regiões do Brasil e da América. Por fim, é imprescindível não esquecer os grandiosos aquários: cristalinos continentes de mar coberto por azeite de dendê.
Vale ainda citar uma chave de leitura incluída pelo artista em um catálogo referente ao seu trabalho, o poema “O Divisor”, de Myra Albuquerque:
Vale ainda citar uma chave de leitura incluída pelo artista em um catálogo referente ao seu trabalho, o poema “O Divisor”, de Myra Albuquerque:
“É oceânica a solidão negra / Em dias atlânticos sabemos ser nosso o / que está distante, / submerso em travessias absurdas, / em náuseas intermináveis. // Foi Atlântico o medo do mar, / a adivinhação da tempestade, a expectativa da rotina. // Foi Atlântica a dissimulação de Esperança: ‘sou vítima do terrível crime / da escravidão’. / Disse ser ela Esperança da Boaventura, / como os Aleluia, os Bomfim, os da / Cruz, os do Espírito Santo. // Mergulhamos num flagelo Atlântico. / Desde então, estamos todos assentados / no fundo do oceano.”
É óbvio, portanto, que Divisor 2 se refere ao oceano Atlântico.
Contudo, essa obra nos ajuda a ver que um oceano, mais do que uma parte da geografia física da Terra, é um domínio de espaço e tempo que deve ser pensado por outra geografia: cultural, histórica, antropológica.
Assim, devemos conectar a obra aos processos sociais estabelecidos por meio do Atlântico a partir da transposição forçada de africanos para serem escravizados na América, do século XVI ao XIX, bem como dos intercâmbios entre esses continentes, que persistem até hoje, e a conseqüente constituição da problemática cultural afro-americana.
Mas o que nos diz o artista pelo modo como articula os elementos na obra? Água, azeite e sal estão justapostos, deliberadamente reunidos em um mesmo recipiente, mas permanecem estanques, separados em camadas, devido a suas particularidades físico-químicas; em suma: em processo de interação conflituosa. O que remete à impossibilidade de pensar o oceano Atlântico sem levar em conta os impasses da diáspora e de suas conseqüências, o mar sem o sangue nele e a partir dele derramado. Transparentes e racionalmente geométricas, as caixas falam de mais do que dão a ver: simbolizam conexões e disjunções de pessoas, grupos sociais, religiões e culturas entre África e Brasil; tempos passados, presentes e futuros; práticas e realizações complexas, densas, turvas, ainda que também instigantes e, muitas vezes, como nessa obra, belas.
Mas o que nos diz o artista pelo modo como articula os elementos na obra? Água, azeite e sal estão justapostos, deliberadamente reunidos em um mesmo recipiente, mas permanecem estanques, separados em camadas, devido a suas particularidades físico-químicas; em suma: em processo de interação conflituosa. O que remete à impossibilidade de pensar o oceano Atlântico sem levar em conta os impasses da diáspora e de suas conseqüências, o mar sem o sangue nele e a partir dele derramado. Transparentes e racionalmente geométricas, as caixas falam de mais do que dão a ver: simbolizam conexões e disjunções de pessoas, grupos sociais, religiões e culturas entre África e Brasil; tempos passados, presentes e futuros; práticas e realizações complexas, densas, turvas, ainda que também instigantes e, muitas vezes, como nessa obra, belas.
LEGENDA(S) DA(S) FOTO(S)
• Obra: Ayrson Heráclito, Divisor 2, 2001. Objeto, vidro, água, azeite de dendê e sal, 300 x 200 x 25 cm.
REFERÊNCIAS
– HERÁCLITO, Ayrson. Espaços e Ações. Salvador: O Autor, 2003.
sobre o(a) autor(a):
Roberto Conduru é historiador da arte, professor no ProPEd e no PPGARTES na UERJ, pesquisador com bolsas Prociência FAPERJ/UERJ e de produtividade do CNPq.
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